Cremesp discute a importância da vacinação contra covid-19
O ano de 2021 se iniciou, no Brasil, com a notícia da chegada das tão esperadas vacinas — a esperança na luta contra o novo coronavírus. Com o intuito de orientar os médicos e a população sobre estes imunizantes, o Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo (Cremesp) promoveu, em janeiro, a aula online “Covid-19: a importância da vacinação”, ministrada pelo presidente do Depto. de Infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Marco Aurélio Palazzi Sáfadi, e pelo diretor da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Renato Kfouri.
O evento foi mediado por Mario Roberto Hirschheimer e Paulo Tadeu Falanghe, coordenador e conselheiro responsável pela Câmara Temática de Vacinação e Imunização do Cremesp, respectivamente. Também estiveram presentes a presidente do Conselho, Irene Abramovich, e o 1° secretário, Angelo Vattimo.
“A vacinação representa a esperança, mas também um grande desafio. Estamos aqui hoje para ministrar essa live extremamente importante que, com certeza, nos auxiliará a compreender melhor a imunização contra covid-19”, declarou Irene, durante a abertura do evento.
Em seguida, Vattimo reforçou a fala de Abramovich, agradeceu a presença dos palestrantes e reiterou as diversas medidas adotadas pelo Cremesp desde o início da pandemia, como a promoção de informação por meio das aulas online e o combate incessante às fake news. “A posição do Conselho sempre será técnica e temos que rebater qualquer tipo de politização. O embasamento, para tudo, deve ser e continuará sendo científico — é isso que buscamos e propagamos”.
CoronaVac/Sinovac x AstraZeneca/Oxford
A primeira palestra foi orquestrada por Sáfadi, que discorreu sobre os imunizantes aprovados pela Anvisa para uso emergencial no Brasil, a CoronaVac e a AstraZeneca. “São várias as plataformas em desenvolvimento, relativas às vacinas, desde o uso de métodos já consagrados, como de vírus inativado, até o de tecnologias absolutamente inovadoras, como vemos com as vacinas de vetores virais e as de RNA mensageiro”, expôs.
O especialista apontou alguns aspectos relevantes sobre a CoronaVac — fruto de uma parceria entre o Instituto Butantan e a chinesa Sinovac — que foi criada com base no próprio vírus inativado, responsável por gerar uma resposta imune ao SARS-CoV-2, o que é algo já comumente visto no País, em vacinas como a da hepatite A e raiva, como exemplos.
Em relação aos estudos, controlados e randomizados, alocados, inclusive, no Brasil, Sáfadi explica que, na fase 2, já se pôde concluir que a utilização de duas doses do imunizante, em um intervalo de 14 dias, propicia uma resposta imune, associada à soroconversão em 94% daqueles que receberam a vacina neste esquema. Por isso, a fase 3 foi coordenada já nestes moldes, e contou com a participação de profissionais de saúde, a partir dos 18 anos, sem limite de idade máxima.
Os resultados demonstraram uma eficácia de 50,38% contra todos os níveis da infecção por SARS-CoV-2, abarcando desde os mais leves até os mais graves. “Mais especificamente, em casos leves a graves, houve uma efetividade de 77,96%. É importante ressaltarmos, também, que não houve nenhuma constatação de doença moderada ou grave no grupo vacinado”, explanou.
Já a vacina da AstraZeneca, produzida no País por meio da parceria entre a FioCruz e a Universidade de Oxford, é uma vacina baseada em vetor viral, mais precisamente em um adenovírus de chimpanzé, geneticamente modificado, que carreia um segmento genômico do SARS-CoV-2, responsável pela produção da proteína S (Spike). Cabe evidenciar que os testes do imunizante foram ministrados também na África do Sul e no Reino Unido.
A metodologia do estudo — também controlado e randomizado — e os critérios utilizados na análise de eficácia se baseiam, resumidamente, na participação de voluntários a partir dos 18 anos, sem limite de idade máxima, como ocorreu com a CoronaVac. Os intervalos utilizados para aplicação dos imunizantes foram de 4 a 12 semanas.
Os resultados dos estudos sugeriram uma eficácia global de 70,4% na prevenção da doença clínica, o que, para Sáfadi, demonstra uma performance muito positiva no sentido de induzir proteção. Não houve constatação de casos de hospitalização ou quadros graves entre os grupos que receberam o imunizante.
Ao final da apresentação, o especialista agradeceu a participação de todos e apontou algumas lacunas existentes em relação à imunização contra a Covid-19. Entre elas, o tempo de proteção induzido após a vacinação; a intercambialidade entre os diferentes produtos; a segurança da aplicação em gestantes, e a resposta imune relativa às mutações do vírus. “Ainda temos muitas perguntas sem respostas. Esperamos que, o quanto antes, elas sejam esclarecidas”.
Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação
“É uma honra participar deste evento tão importante, neste momento tão difícil. Agora, enfrentaremos um processo tão desafiador quanto licenciar e desenvolver imunizantes, que é transformar estas vacinas em vacinação”, afirmou Kfouri, antes de iniciar sua apresentação sobre o Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação contra a Covid-19.
Segundo Renato, o principal objetivo da implementação do Programa é a redução da morbimortalidade causada pelo novo coronavírus, bem como a manutenção do funcionamento da força de trabalho dos serviços de saúde e do funcionamento dos serviços essenciais. Mais especificamente, vacinar os grupos de maior risco de desenvolvimento de formas graves e óbitos pela doença e também indivíduos com maior risco de infecção, principalmente aqueles que prestam atendimentos indispensáveis à sociedade.
De acordo com o documento, que definiu os alvos prioritários da campanha, a vacinação seguirá o seguinte fluxo:
1. Idosos (60 anos ou mais)
2. Indígenas vivendo em terras indígenas
3. Trabalhadores de saúde
4. Povos e comunidades tradicionais ribeirinhas e quilombolas
5. Pessoas com determinadas morbidades
6. População privada de liberdade e funcionários deste sistema
7. Pessoas em situação de rua
8. Forças de segurança e salvamento e Forças Armadas
9. Pessoas portadoras de deficiência
Kfouri explicou que, considerando a disponibilidade limitada de doses da vacina, os critérios que definem os públicos priorizados foram relativos à exposição à infecção e à presença de maiores riscos para agravamento e óbito pela doença.
A administração simultânea com outras vacinas, segundo o especialista, ainda se apresenta como uma das lacunas existentes, mencionadas por Sáfadi. “Tendo em vista a ausência de estudos de coadministração, neste momento, não se recomenda a aplicação das vacinas contra Covid-19 em paralelo a outros imunizantes”, reforçou, explicando que preconiza-se um intervalo de 14 dias entre as vacinas para o SARS-CoV-2 e as demais, presentes no Calendário Nacional de Vacinação.
Outro ponto importante, ressaltado por Kfouri, versa sobre algumas das precauções a serem tomadas em relação à imunização, como o adiamento da vacinação, em casos nos quais o indivíduo apresenta doenças agudas febris moderadas ou graves, até a resolução do quadro, e também em situações nas quais há suspeita de infecção em atividade, pelo vírus.
Contraindicações
Um fator que tem gerado polêmica e discussão refere-se às contraindicações do imunizante. De acordo com o especialista, para pessoas com menos de 18 anos ou que possuem hipersensibilidade ao princípio ativo ou a qualquer dos excipientes da vacina, bem como para aqueles que já apresentaram reação anafilática confirmada, relativa a uma dose anterior de imunizante contra a Covid-19, a vacinação é contraindicada.
Já em relação aos grupos especiais — gestantes, lactantes e puérperas — não houve (pelo menos não até o momento da promoção desta live) avaliação da eficácia da vacina. O que se sabe é que os estudos feitos em animais não demonstraram riscos de malformações nas que estavam grávidas. Lactantes podem ser vacinadas sem interrupção da amamentação.
Pessoas que fazem uso de antiagregantes plaquetários devem continuar com o tratamento, pois os mesmos não implicam em impedimento à vacinação, assim como as injeções intramusculares em pacientes sob uso crônico dessas medicações.
Portadores de doenças reumáticas imunomediadas (DRIM) devem ser vacinados, preferencialmente, estando com a doença controlada ou em remissão, como também em baixo grau de imunosupressão ou sem a mesma. “Cabe ressaltar que esta é uma escolha que deve ser individualizada e acordada entre o médico e o paciente. É necessário, também, levar em consideração alguns aspectos, como a faixa etária e eventuais comorbidades em paralelo”, ressaltou Kfouri.
Em casos de pacientes oncológicos, transplantados e demais imunossuprimidos, ainda não houve (pelo menos não até o momento da promoção desta live) avaliação da eficácia da vacina. No entanto, considerando as plataformas de vírus inativado, é improvável que exista risco aumentado de eventos adversos e a vacinação deve ser realizada.
Farmacovigilância
“A nítida rapidez com que as vacinas contra a Covid-19 foram desenvolvidas, utilizando novas tecnologias de produção, que serão utilizadas massivamente na população, podem desencadear um alto número de notificações de eventos adversos pós-vacinação (EAPV)”, alertou Kfouri, ressaltando que pode ocorrer a exacerbação de fenômenos, que podem ter relação temporal com o imunizante, mas não necessariamente causal, o que pode sequenciar situações de desconforto, desconfiança e descredibilidade na vacinação.
O especialista apontou que, para o manejo apropriado dos EAPV de uma nova vacina, é necessário contar com um sistema de vigilância sensível para avaliar a segurança do produto e dar resposta rápida a todas as preocupações da população relacionadas aos imunizantes. Estas atividades demandam, indubitavelmente, uma notificação e investigação veloz e adequada às adversidades ocorridas.
Durante a apresentação, Kfouri ainda listou os principais componentes de um sistema EAPV, que resumem-se à detecção, notificação e investigação (exames clínicos, laboratoriais, etc), e reforçou que, usualmente, é recomendada a notificação de todos EAPV graves para os imunizantes de uso rotineiro no Programa Nacional de Imunização (PNI), bem como surtos de eventos adversos leves.
Ao final da aula, os palestrantes tiraram dúvidas do público, que encaminhou as perguntas por meio das redes sociais do Cremesp, responsáveis por realizar a transmissão ao vivo do evento.
A live está disponível, na íntegra, no link https://www.youtube.com/watch?v=At30vv0D7B0&t=2553s.
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